Reduzir para ganhar mais saúde

Reduzir para ganhar mais saúde

Quando se fala em desenvolver produtos mais saudáveis nas indústrias, as reduções de gordura, sal e açúcar estão entre os mais necessários, porque impactam diretamente a saúde do consumidor.


A OMS (Organização Mundial da Saúde) tem divulgado suas recomendações para a redução desses ingredientes para evitar a alta de obesidade, doenças cardiovasculares, diabetes, entre outras que impactam a saúde pública. Apesar do surgimento de novas tecnologias, as dificuldades em encontrar soluções para alimentos processados não são poucas. Para falar sobre os desafios na redução desses ingredientes essenciais nos alimentos industrializados, em especial, nos lácteos, consultamos a professora Eliana Paula Ribeiro, coordenadora do curso de Engenharia de Alimentos do Instituto Mauá de Tecnologia


Por: Juçara Pivaro

Menos gordura, missão resgatar o sabor

Para reduzir o teor de gordura, uma das técnicas mais comuns é aumentar o teor de proteínas, particularmente as proteínas do soro, utilizando leite desnatado como matéria-prima. As proteínas do soro são eficazes em substituir a gordura, mas não conseguem replicar completamente o sabor característico que ela proporciona.

Segundo a coordenadora e professora Eliana, a redução de gordura pode afetar bastante a percepção sensorial, especialmente o sabor. Como ela é um transportador importante de sabor, produtos com menos gordura tendem a ser menos saborosos. Para imitar e melhorar a percepção na boca, frequentemente, são utilizados aromas adicionais. Além disso, a cremosidade e a textura também são impactadas, podendo resultar em uma sensação mais aquosa ou menos espessa, o que pode influenciar a percepção de qualidade.

A professora Eliana lembra ainda que mais do que o uso de ingredientes ou aditivos podem ser utilizados processos, como por exemplo, o uso de ultrafiltração para aumentar o teor de proteínas do soro, que são substitutos da gordura, conforme já mencionados. No caso do uso de ingredientes ou aditivos, eles irão influenciar na consistência ou textura, como as proteínas do soro, normalmente são compostos que ligam grandes quantidades de água em baixas concentrações como os hidrocoloides, usualmente combinados com emulsificantes e, para balancear o aroma e o sabor, com aromatizantes.

A redução de gordura afeta bastante o processo de fabricação de produtos como iogurtes e sorvetes. No iogurte, isso pode resultar em uma viscosidade menor, exigindo um aumento no teor de proteínas ou a adição de estabilizantes. Já nos sorvetes, a gordura é crucial para a textura cremosa e sua redução pode tornar o sorvete mais duro e menos saboroso, exigindo mais estabilizantes e emulsificantes para manter a qualidade.

Menos Sal, missão resgatar conservação

Os principais desafios tecnológicos consistem na redução da percepção do sabor, problemas de textura, preservação e qualidade dos produtos. O sal além de auxiliar na percepção do sabor, contribuir para a estrutura e consistência dos produtos, também auxilia na redução da atividade de água, aumentando a segurança e o tempo de preservação dos alimentos. O sal possui elevada capacidade de interagir com a água e pode interagir com outros componentes, como as proteínas, afetando as características e estabilidade dos produtos.

A professora Eliana afirma: “em relação aos aspectos sensoriais, o sal contribui para o aroma, textura e sabor característicos dos produtos. Ele é um dos principais responsáveis pelo sabor em produtos lácteos, especialmente em queijos. A redução de sal pode resultar em uma perda de sabor desejado, tornando o produto menos atraente para os consumidores. A sensação de salgado é rapidamente percebida, e a redução pode afetar a aceitação do consumidor, que pode considerar o produto sem sabor ou insípido. O aroma e a percepção bucal também serão afetados, influenciando na aceitação do produto”.

Várias alternativas têm sido exploradas, como o cloreto de potássio (KCl), que pode ser um substituto parcial, embora tenha um gosto amargo. Segundo a professora Eliana, ácidos como os ácidos cítrico ou lático podem melhorar a percepção de sabor em produtos com baixo teor de sal. A substituição de sódio por potássio ou cálcio ajuda a manter o equilíbrio eletrolítico. Aromatizantes naturais e especiarias também são utilizados para intensificar o sabor, e a microencapsulação de sal pode liberar compostos gradualmente, melhorando a percepção de sabor.
O sal tem ainda o efeito de preservar alimentos, reduzindo a atividade da água e inibindo o crescimento de microrganismos. A redução do sal pode aumentar a disponibilidade de água, elevando o risco de contaminação microbiológica e diminuindo a vida útil dos produtos. Isso pode exigir o uso de tecnologias de conservação adicionais, como embalagem a vácuo e controle rigoroso de temperatura.
Diferenças nos queijos

Há diferenças significativas no impacto da redução de sal entre queijos maturados e queijos frescos. A redução de sal em queijos frescos tende a ter um impacto mais imediato na vida útil e segurança microbiológica, enquanto em queijos maturados os efeitos são mais relacionados ao sabor e ao processo de cura.

A professora Eliana complementa: “em queijos maturados o sal desempenha um papel crucial no processo de maturação, influenciando a formação de textura, sabor e cor. A redução de sal pode interferir no desenvolvimento adequado da microflora benéfica durante a maturação. A redução de sal pode comprometer o equilíbrio microbiano e afetar a formação de compostos de sabor desejados, prejudicando a qualidade sensorial do produto. Os queijos maturados têm uma vida útil naturalmente mais longa devido ao processo de cura, etapa na qual são produzidas substâncias que limitam o desenvolvimento de microrganismos contaminantes e compensar, em parte, a redução do sal”.

No caso de queijos frescos, a redução de sal pode afetar rapidamente a conservação do produto, uma vez que eles não passam por um processo de maturação e têm maior atividade da água, o que os torna mais susceptíveis à deterioração microbiológica. A professora Eliana informa: “como os queijos frescos são consumidos em prazos mais curtos, a redução de sal pode diminuir a capacidade do produto de se conservar adequadamente e aumentar o risco de contaminação. A redução do sal também pode afetar a textura e o sabor, tornando o queijo fresco menos palatável para os consumidores.

Menos açúcar, mais impacto no consumo

A substituição ou redução de açúcar em produtos lácteos é um tema cada vez mais relevante diante das mudanças nas preferências do consumidor por produtos mais saudáveis. Contudo, essa reformulação envolve desafios tecnológicos e sensoriais significativos. O açúcar não é apenas responsável pelo sabor doce, mas também desempenha funções cruciais, como equilibrar a acidez, intensificar sabores de frutas adicionadas, controlar a textura e reduzir o ponto de congelamento – fator essencial em sorvetes e produtos congelados. Além disso, o açúcar contribui para a conservação ao reduzir a atividade de água, dificultando o desenvolvimento de microrganismos e aumentando a vida útil dos alimentos.

Sem a presença do açúcar, problemas como alterações na textura, consistência e até no sabor podem surgir, impactando negativamente a aceitação do produto pelo consumidor. A solução, muitas vezes, está na busca por ingredientes substitutos, como adoçantes naturais ou artificiais, que imitam o sabor doce sem comprometer o perfil nutricional.

Adoçantes: aceitação e desafios

A aceitação de adoçantes naturais ou artificiais pode variar, dependendo de vários fatores, como tipo de adoçante, preferências do consumidor e tendências do mercado. A professora Eliana destaca: “adoçantes como stevia, xilitol, eritritol e melaço são frequentemente bem aceitos, especialmente por consumidores que buscam alternativas mais similares aos naturais, ou seja, originalmente presentes no alimento. Adoçantes como a stevia têm ganhado popularidade devido à sua origem vegetal e baixo impacto glicêmico. No entanto, alguns consumidores podem não gostar do gosto residual amargo que certos adoçantes podem deixar”. 

Adoçantes como aspartame, sacarina e sucralose possuem elevada capacidade adoçante em muito baixas concentrações. “Eles estão sujeitos a maior rejeição por parte do consumidor, mal informado e influenciado por falsas informações, uma vez que são produtos permitidos por uma legislação extremamente rigorosa para sua adição a alimentos e com comprovada segurança ao seu consumo”, esclarece Eliana. 

Impactos na textura e estabilidade dos produtos

O papel do açúcar varia de acordo com o tipo de produto lácteo. Em itens como leites condensados e doces, o açúcar é fundamental para a estabilidade e o controle da textura, devido à sua alta capacidade de ligação com a água. Já em iogurtes, sobremesas e leites fermentados, onde a concentração de açúcar é menor, as proteínas desempenham um papel mais significativo na consistência. Nesses casos, a redução de açúcar pode ser menos problemática.

Mudanças na rotulagem e tendências de mercado

A professora Eliana conclui: “reformulações com menos açúcar trazem implicações diretas para a rotulagem nutricional e atendem às demandas de um público cada vez mais atento à saúde. Rótulos como “sem adição de açúcares” e “baixo teor de açúcar” são atrativos para consumidores preocupados com calorias, dietas especiais e condições como diabetes e obesidade. Além disso, a redução de açúcar pode alterar os valores calóricos e o perfil nutricional do produto, aspectos que podem ser explorados como diferenciais competitivos”.

A tendência por produtos com menor teor de açúcar é impulsionada por mudanças nos hábitos de consumo e pela busca por alimentos mais alinhados a um estilo de vida saudável. Esse movimento reflete uma preocupação crescente com saúde, bem-estar e a adesão a dietas específicas, como as de baixo carboidrato. Para a indústria láctea, o desafio é equilibrar inovação e sabor, mantendo a competitividade e a aceitação do consumidor.

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